segunda-feira, agosto 08, 2005

How I Learned to Stop Worrying About the Bombs and Engaged My Anus*

*Interrompendo a ordem normal de trabalhos narcísicos e umbiguistas neste blog, abre-se o espaço seguinte a um «artista convidado». Quando ouvi pela primeira vez a expressão engage the anus não resisti a pedir à Catarina que escrevesse um texto sobre o assunto. Ainda tentei convencê-la a criar um blog - Blog The Anus poderia ser um título interessante -, mas a Catarina respondeu que blogs eram «veículos de pessoas neuróticas com aspirações a reconhecimento social ou literário», e deu-me uma pancadinha na cabeça com a bengala de um colega nosso. Deixou-me, felizmente, pôr aqui o texto. Enjoy.

Qual é a relação entre o Ioga e a Guerra das Estrelas? Nenhuma, deveria ser a resposta correcta e sensata a esta pergunta. Mas a verdade é que descobri, após observação intensa, que existe uma ligação profunda entre esta prática milenar e os filmes de culto de George Lucas, particulamente a «religião Jedi».

O Ioga surgiu ligado ao Hinduísmo, no subcontinente indiano há 5000 anos. É uma forma de misticismo, uma filosofia, uma disciplina, que incorpora exercícios físicos, reflexologia, meditação e respiração.

Nos anos 60, o Ioga tornou-se moda na Europa e Estados Unidos, graças ao interesse psicadélico do movimento Hippie, e depois New Age, por tudo o que era oriental, exótico e místico.

Hoje, existem milhares de cursos e aulas dos vários ramos do Ioga. Em Londres, passei os últimos dez anos em busca da «aula perfeita», aquela que nos deixa purificados, relaxados, centrados e em unidade completa com o universo.

Ou seja, atingir o estado do nirvana, sentir que queremos abraçar árvores, sorrir beatificamente perante adversidades e despir-nos de qualquer vestígio de ego.

Não admira que não tenha encontrado este El Dorado do Ioga. Em vez disso vi-me numa série de situações que quero aqui relatar.

A minha experiência de deambulante aprendiz ensinou-me que existem três tipos de aulas: as convencionais, as normais e as sobrenaturais. A prática convencional ocorre no ambiente sanitizado e americanizado dos ginásios. Aqui não se registam encontros do terceiro grau com adeptos da «ideologia Jedi». Faz-se Ioga, como se podia fazer aeróbica a la Jane Fonda, nos anos 80.

Depois existem as aulas normais que decorrem em centros especialmente criados para a prática do Ioga. São classes competitivas por excelência e os praticantes envergam «roupas de Ioga», roupagens é mais a palavra indicada para esta indumentária: calças de linho largas e camisolas com símbolos hindus e budistas. As pessoas trazem os seus próprios colchões de espuma, que transportam em malas especiais. Estes centros piscam o olho à Índia, com uma decoração que prima pelas referências pictóricas a flores de lótus, plantas de bambu em vasos e uma brancura e simplicidade minimalistas. Aqui costuma aparecer «o homem de serviço» (HDS) - ou único homem da aula, uma espécie que que me deixa sempre um pouco perplexa.

Não digo isto por mal. É que normalmente o HDS parece frequentar as aulas de Ioga, não para aumentar a sua flexibilidade e o bem-estar físico e mental, mas com o objectivo de ver mulheres em determinadas posições sugestivas (de pernas abertas, de pernas para o ar, com o rabo espetado, etc.) e eventualmente até convidá-las para um sumo de cenoura ou um pastel de seitan macrobiótico.

É nas aulas sobrenaturais que entramos na esfera «Guerra das estrelas». Já fiz Ioga em escolas (infantilizante...), igrejas (gelado no Inverno...) quartel dos bombeiros (surreal...) e em casas de pessoas. Os instrutores têm nomes compostos apenas por uma sílaba. Zan, Pi, Xen, e convertem um espaço na sua própria casa à prática do Ioga, enchendo-o de velas, música com sons da floresta amazónica ou o cantar dos grilos. É tudo mais descontraído e transcendente. É neste contexto que a «religião Jedi» é difundida. Ramos do Ioga, como "Hatha" insistem em exercícios respiratórios, alguns dos quais simulam o processo de inspiração e expiração de Darth Vader. Trata-se de um som profundo e gutural que se situa entre os suspiros de Marge Simpson e a respiração ofegante de homens perversos em chamadas anóninas mal intencionadas.

Ou seja, quando não estamos a praticar a respiração Darth Vader, instrutores New Age, que falam na criança dentro de nós e em termos de terapia ou psicologia de auto-ajuda barata começam a indoutrinar-nos na "Força".

«Sinto um distúrbio... na espinha», dizia uma professora de Ioga australiana. «Sintam a força, aceitem a força...está nos joelhos». «Posição do sapo, Bhekasana: engage the anus («activem o ânus»). Olhei em volta, mas ninguém tinha achado inapropriada, ou até pornográfica, a referência ao ânus. O resto das pessoas na aula continuava concentrada na tarefa de levantar o traseiro de maneira imperturbável e activa.

O tipo de instrutores que ensina Jedi, fala do Ioga como se o próximo passo após as posturas invertidas, ou a posição do corvo ou da cobra, fosse a levitação de naves espaciais como aconteceu no treino de Luke Skywalker, pelo vetusto Yoda. É tudo uma questão de disciplina, auto-controle, domínio da força, do bom lado da força, claro.

Esta obssessão com a religião Jedi não é de estranhar no Reino Unido, onde no último recenseamento às crenças religiosas da população, uma percentagem de 0,7 % dos inquiridos revelou seguir o «jedismo».

Será isto um acto de irreverência contra a religião oficial? Duvido, porque a Igreja de Inglaterra perde fiéis como eu perco guarda-chuvas. As igrejas estão virtualmente «às moscas», dado que os que procuram conforto espiritual têm à sua escolha opções muito mais entusiasmantes como o paganismo-druidismo, a cientologia, o budismo reformado dos Soka Gakkai e o sempre fascinante satanismo.

A verdade é que a fé Jedi atrai inúmeros adeptos por ser eclética e incorporar elementos de várias crenças. A luta maniqueísta entre o Bem e o Mal, a luz e as trevas soa à dicotomia entre Deus e Diabo no cristianismo. Existem alusões ao caminho interior, e à disciplina mental do budismo - let it go, Luke

E também há fortes paralelos com o hinduismo. Académicos e estudiosos da «Guerra das Estrelas», que dão aulas em universidades britânicas e americanas, explicam que Lucas foi influenciado acima de tudo pela mitologia indiana. O Ramayana, uma epopeia que originou vários mitos e tradições hindus relata a história de uma princesa, Sita, raptada por um guerreiro maléfico e sedento de poder, Ravana. O apaixonado da princesa, o herói Rama, lança-se então à tarefa hérculea de a salvar acompanhado de estranhas criaturas parte homens, parte animais. Se isto soa familiar, juntamente com a meditação e a busca da paz interior, talvez seja porque na verdade Ioga e Yoda são parte da mesma «Força».

Catarina F.


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«Hmmrpfff, engage the anus you must, my young Padawan, and then feel the Force inside your buttocks you will».
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