Clube de leitura revisitado: reviver o passado nos clubes de leitura?* (Parte II)
Analisando a dinâmica deste grupo particular sobressaíam três pessoas, cujo único objectivo era dominar as massas e falar sem parar, numa torrente de análises, hipóteses e crítica literária. Uma delas foi galardoada por mim com o prémio do "louco varrido".
Alto, gordo, com óculos de lentes grossas e o cabelo sujo a cair nos ombros trajava fato de treino, apesar de não parecer ter posto o pé no ginásio em muitos anos. Com a respiração ofegante, distribuíu mapas e planos para que nós compreendermos onde decorria a acção de "Washington Square". Foi o sinal de alerta que tinha imenso tempo livre, além de opiniões estranhas.
Imaginei-o num quarto desarrumado e decorado ao estilo anos 70 (e não estou a referir-me ao aspecto sofisticado ou de revivalismo irónico pós-moderno da dita década) a procurar artigos na internet para se informar e estudar o tema de modo a poder impressionar os membros do clube de leitura.
O "louco varrido" começava as todas as frases com "o que ninguém aqui percebeu é que..."; neste caso o que nós ignorantes não tinhamos apercebido foi das inúmeras referências matemáticas ocultas na nomenclatura dos locais, das personagens, símbolos e sinais esotéricos enterrados em páginas.
Afinal, li o livro errado, reflecti, parece-me que no fim de contas estamos a debater o código da Vinci! A verdade é que o homem tinha razão que ninguém compreendia nada do que ele dizia quando falou do "aspecto cabalístico" do pobre Henry James que devia estar a dar voltas no caixão.
O tema da situação das mulheres veio à baila e "louco varrido" quis mostrar-se bastante emancipado declarando que "as mulheres eram oprimidas na sociedade nova-iorquina vitoriana". Poderia argumentar-se que os Estados Unidos já eram uma república que nada queria ter que ver com a temível Rainha Vitória.
Possivelmente psicopata, o nosso protagonista (ninguém mais conseguiu quase falar) começou a fixar os seus medonhos olhos na "Bridget Jones" que desapontada pela falta de um final feliz, lançou-se numa defesa incompreensível de Morris Townsend, o mauzão do livro. "Se ao menos lhe tivessem dado uma hipótese, se o tivessem deixado em paz, ele teria casado com a herdeira rica como queria".
Aproveitando os problemas respiratórios do "louco varrido" entretido a tossicar, várias pessoas lembraram que Morris era um canalha, que tinha enganado a ingénua Catherine, que era preguiçoso e imoral. "Bridget Jones" voltou à carga, e usou os dedinhos para fazer o sinal de aspas (como odeios pessoas que fazem isto, principalmente em séries americanas sem piada). "Give him a break", soltou a apologista do escroque.
Começei a divagar e a pensar noutras personagens literárias: "Give him a break", se ao menos tivessem dado uma hipótese ao Hanibal Lecter ele não tinha comido aquela gente toda! E o Frankenstein? E o King Kong, coitadinho, era um gorila tão simpático. Se o tivessem deixado casar com a rapariga, os arranha-céus e carros tinham sido poupados.
Claro que estou a exagerar, mas é só para terem uma ideia. Acho que me fartei de ser o narrador objectivo à maneira de Henry James. Querem saber se me pronunciei? Apenas para dizer que tinha muita pena de Catherine, que me pareceu uma personagem cheia de dignidade e que estava dividida entre o sentimento de dever e a paixão pelo "Mr Wrong" (a Bridget Jones devia empatizar).
Um dos homens olhou para mim e disse mas ela é tão "boring!" está sempre a bordar...! Não sabia como explicar-lhe que era isso que as mulheres faziam naquela altura, mas não foi preciso encontrar palavras porque o "louco varrido" tinha para dar e vender.
Excitado com o próximo encontro sugeriu "as árvores também choram", um livro de que ninguém tinha ouvido falar, mas que foi rejeitado pelo grupo por unanidade com base no teor absurdo do título. Gostaria de saber se algum dos membros do clube de leitura vai aparecer no próximo encontro. É que eu não posso ir... como dizem nas séries americanas: vou ter que lavar o cabelo nesse dia.
Alto, gordo, com óculos de lentes grossas e o cabelo sujo a cair nos ombros trajava fato de treino, apesar de não parecer ter posto o pé no ginásio em muitos anos. Com a respiração ofegante, distribuíu mapas e planos para que nós compreendermos onde decorria a acção de "Washington Square". Foi o sinal de alerta que tinha imenso tempo livre, além de opiniões estranhas.
Imaginei-o num quarto desarrumado e decorado ao estilo anos 70 (e não estou a referir-me ao aspecto sofisticado ou de revivalismo irónico pós-moderno da dita década) a procurar artigos na internet para se informar e estudar o tema de modo a poder impressionar os membros do clube de leitura.
O "louco varrido" começava as todas as frases com "o que ninguém aqui percebeu é que..."; neste caso o que nós ignorantes não tinhamos apercebido foi das inúmeras referências matemáticas ocultas na nomenclatura dos locais, das personagens, símbolos e sinais esotéricos enterrados em páginas.
Afinal, li o livro errado, reflecti, parece-me que no fim de contas estamos a debater o código da Vinci! A verdade é que o homem tinha razão que ninguém compreendia nada do que ele dizia quando falou do "aspecto cabalístico" do pobre Henry James que devia estar a dar voltas no caixão.
O tema da situação das mulheres veio à baila e "louco varrido" quis mostrar-se bastante emancipado declarando que "as mulheres eram oprimidas na sociedade nova-iorquina vitoriana". Poderia argumentar-se que os Estados Unidos já eram uma república que nada queria ter que ver com a temível Rainha Vitória.
Possivelmente psicopata, o nosso protagonista (ninguém mais conseguiu quase falar) começou a fixar os seus medonhos olhos na "Bridget Jones" que desapontada pela falta de um final feliz, lançou-se numa defesa incompreensível de Morris Townsend, o mauzão do livro. "Se ao menos lhe tivessem dado uma hipótese, se o tivessem deixado em paz, ele teria casado com a herdeira rica como queria".
Aproveitando os problemas respiratórios do "louco varrido" entretido a tossicar, várias pessoas lembraram que Morris era um canalha, que tinha enganado a ingénua Catherine, que era preguiçoso e imoral. "Bridget Jones" voltou à carga, e usou os dedinhos para fazer o sinal de aspas (como odeios pessoas que fazem isto, principalmente em séries americanas sem piada). "Give him a break", soltou a apologista do escroque.
Começei a divagar e a pensar noutras personagens literárias: "Give him a break", se ao menos tivessem dado uma hipótese ao Hanibal Lecter ele não tinha comido aquela gente toda! E o Frankenstein? E o King Kong, coitadinho, era um gorila tão simpático. Se o tivessem deixado casar com a rapariga, os arranha-céus e carros tinham sido poupados.
Claro que estou a exagerar, mas é só para terem uma ideia. Acho que me fartei de ser o narrador objectivo à maneira de Henry James. Querem saber se me pronunciei? Apenas para dizer que tinha muita pena de Catherine, que me pareceu uma personagem cheia de dignidade e que estava dividida entre o sentimento de dever e a paixão pelo "Mr Wrong" (a Bridget Jones devia empatizar).
Um dos homens olhou para mim e disse mas ela é tão "boring!" está sempre a bordar...! Não sabia como explicar-lhe que era isso que as mulheres faziam naquela altura, mas não foi preciso encontrar palavras porque o "louco varrido" tinha para dar e vender.
Excitado com o próximo encontro sugeriu "as árvores também choram", um livro de que ninguém tinha ouvido falar, mas que foi rejeitado pelo grupo por unanidade com base no teor absurdo do título. Gostaria de saber se algum dos membros do clube de leitura vai aparecer no próximo encontro. É que eu não posso ir... como dizem nas séries americanas: vou ter que lavar o cabelo nesse dia.
Catarina F.
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