- Esta série infantil de posts apresenta sinais de engraçadismo, o terceiro dos quatro sinais do apocalipse blogosférico segundo José Pacheco Pereira. - Vahina Giocante?
- Mas o que aconteceu afinal entre vocês os dois? - Acabou tudo quando descobri que ela não passava de uma Vahina Giocante. - Mais ainda a amas? - Como se fosse possível amar uma Vahina Giocante.
São muitos os que injuriam gratuitamente a classe dos tradutores de títulos de filmes estrangeiros para português, uma profissão tão valorosa que imagino ser exclusiva no seu métier. Profissionais desprezados, muitas vezes maltratados, na realidade linguistas de rigor e filólogos subestimados.
Não serão críticas desprovidas de senso já que, em tempos recentes, temos visto consumar-se a tendência para a literalidade e a escolha do facilitismo da correlação tradutiva simples. Sei que não estou sozinho quando me choco com a falta de criatividade em trabalhos como I Am Legend / Eu Sou a Lenda, ou, pior, a cada vez mais comum manutenção do título original, como acontece em Match Point, ou nos mais recentes Call Girl e Não Me Toques nas Bolas.
Será uma boa altura para recordarmos o génio responsável pela famosa tradução Die Hard/Assalto ao Arranha-Céus. Um homem, ou mulher, a quem nem os grandes estúdios americanos conseguiram fazer frente com a sequela Die Hard 2, a que respondeu com um brilhante Assalto ao Aeroporto. Infelizmente, e como todos os homens, ou mulheres, à frente do seu tempo, terá sido afastado pelos grandes lobbies da indústria portuguesa de títulos de filmes, que ao terceiro filme da série de Bruce Willis (Die Hard 3 - The Vengeance) impuseram um Die Hard 3 - A Vingança. Uma tradução exasperante e óbvia, que afasta de cena o naturalíssimo Assalto à Grande Maçã. Isto sem falar no quarto filme da série onde, contra tudo e todos, o natural Assalto ao FBI aos Estados Unidos à Economia ao Sistema Capitalista e a Tudo de Bom Que Há No Mundo foi substituído por Die Hard 4.0 - Viver ou Morrer.
Este homem, ou mulher, cuja identidade permanecerá desconhecida para o mundo, representava tudo o que de valoroso havia na profissão de tradução de títulos de filmes estrangeiros para português, algo que achei estar perdido até ter ido ao Blockbuster no dia antes de ontem.
Homem de gostos requintados e sentido estético e cinéfilo apurado, fui de imediato atraído pela caixa do filme Entre as Pernas de Lila, um filme francês de Ziad Doueiri com uma classificação de 7.1 no IMDB e um decote na capa. Por curiosidade (e uma vaga réstia de esperança) tive de ir ver qual o título original. Não sou grande coisa a francês, que substitui pelo Grego Clássico no Secundário no dia em que a professora me disse "vien ici!" e eu lhe respondi "os meus parabéns", mas desconfio que não se fala em pernas no título original do filme - Lila Dit Ça.
Este homem, ou mulher, que decide pôr alguém entre as pernas de Lila, é um sinal de esperança para os bons amantes da tradução de títulos de filmes estrangeiros para português. A sua existência, perversão acutilante e falta de bom senso faz-nos acreditar no futuro da profissão.
Tomemos, a título de exemplo, três soporíferos exemplos do passado recente da história da tradução de filmes estrangeiros para português e imaginemos como ficariam às mãos deste iluminado. Para um The Constant Gardener (O Fiel Jardineiro)teríamos um Entre as Pernas da Mulher do Jardineiro Constante (Ou Talvez Não). The Legends of the Fall (Lendas de Paixão) dariam lugar a Entre as Pernas de Três Irmãos Mas Especialmente das do Brad Pitt. Brokeback Mountain (O Segredo de Brokeback Mountain) não poderia ser menos que Entre as Pernas de Dois Cowboys e Não Nos Referimos a Cavalos.
Claro que, por mais entusiasmo que este promissor talento nos inspire, não nos podemos nunca esquecer daquele a quem devemos tanto. E, se não tivesse desaparecido tão cedo de entre nós, fazer um esforço feliz para imaginar um mundo onde Brokeback Mountain seria apenas Assalto ao Rabo do Cóboi.
Boa noite.
nota: gostaria apenas de referir que o nome original da actriz de Entre as Pernas de Lila é Vahina Giocante.
Depois de quedas pouco vertiginosas, um ligeiro incremento nas visitas do blogue no inicio deste ano revela que alguns, poucos, cinco leitores acreditam. E talvez nao estejam enganados porque, mesmo sem acentos, tenho visto quadros nos ultimos dias.