terça-feira, maio 30, 2006

A verdade é que ela tinha um complexo major de histocompatibilidade irresistível

Artigo sobre «química sexual» (se for em termos científicos não é cliché, ah!) no Sunday Times:

Sexual attraction: the magic formula
Finding your perfect match really is about the right chemistry, but it’s a complex equation, says the American scientist Martie G Haselton


«[...] Fascinating work on genetics and mate preferences has shown that each of us will be attracted to people who possess a particular set of genes, known as the major histocompatibility complex (MHC), which plays a critical role in the ability to fight pathogens. Mates with dissimilar MHC genes produce healthier offspring with broad immune systems. And the evidence shows that we are inclined to choose people who suit us in this way: couples tend to be less similar in their MHC than if they had been paired randomly.

How do people who differ in their MHC find each other? This isn’t fully understood, but we know that smell is an important cue. People appear to literally sniff out their mates. In studies, people tend to rate the scent of T-shirts worn by others with dissimilar MHC as most attractive. This is what sexual “chemistry” is all about. [...]»

A primeira pessoa que gritar contra a "racionalização do amor" é um gene podre.

segunda-feira, maio 29, 2006

'This song is about Meredith Baxter Burney, not about splitting wood in your eyes!'

Antes de ser cientólogo, não podemos esquecer que Isaac Hayes foi Isaac Hayes. E depois foi o Chef de South Park. E quando Trey Parker, sobretudo ele, compõe o melhor anti-clássico de soul de todos os tempos, só a voz de Isaac Hayes, que em tempos foi Isaac Hayes, consegue tornar uma paródia de canção em mais um grande tema que nos inspira e nos leve a dizer «I want to make sweet love to you» a qualquer mulher que o mereça. Mesmo com o Meatloaf lá pelo meio.

The rain is falling and Jay Leno is on
Let's turn down the lights,
turn up the volume and go crazy.

domingo, maio 28, 2006

Sem vergonha

Algumas imagens que estavam abandonadas - por boas, excelentes, razões - na pasta 'My Pictures' e que, agora trago para a luz do blogue, para o entreter a si, o "leitor" (com aspas), e alcançar a redenção depois de me ter divertido durantes dois dias seguidos no Rock In Rio.

Na altura das Presidenciais tinha bastante tempo livre e planos megalómanos para satirizar todos os candidatos. Ainda assim, o facilitismo de algumas piadas esbarrou no bom senso que me caracteriza enquanto indíviduo, mas não como cidadão ou bloguista. P.ex:


«Digo-lhe com toda a franqueza que chega a atingir os 40 centímetros!»


«Não acredito.»


«35?»


«Não me parece.»


«Ah... ah... Talvez 15 esteja mais próximo da verdade...»


«Pois.»


«Mas uma vez dei sete seguidas! Sete!»


«Saia.»



Adiante.

Em baixo, uma fotografia (que não me lembro onde arranjei) de um homem a chorar. Reconheço potencial nesta imagem, mas não me ocorre o porquê de a ter gravado ou qualquer utilidade prática que resulte de ter isto no meu disco rígido. Já agora, sei que este homem é francês, e isso parece-me deveras importante.






Moving along.

Uma pessoa vai a casa do melhor amigo dizer à recém-mulher dele que a ama loucamente. É provavelmente uma das cenas de filme romântico mais cretinas de sempre. Não sei porque tenho essa imagem no 'My Pictures'. Desconfio da minha irmã e talvez esteja relacionado com o facto de eu ter sido vizinho da Keira Knightley em Londres. (Já tinha falado nisso?)


To me you are absurd.





Pessoas de bem e de poesia decerto que veriam na próxima imagem, que encontrei num site qualquer de 'old pictures', algo de belo e metafórico. Guardei-a para o dia em que também me ocorresse algo de belo e metafórico que ilustrasse a fotografia. Mas só me ocorre o perigo e inconsciência que é estar enfiado com uma namorada num buraco enorme no meio da praia, rodeado por um bando de maconheiros.






Quando tive esta ideia achei-a brilhante. Poderia culpar a minha baixa aptidão para o Photoshop (embora já saiba o que são layers) pelo embaraçoso resultado final, mas provavelmente estava bêbado quando pensei nisto. Table dance - Stable dance... pois.


Mil perdões.




Para terminar em grande. Esta talvez seja a única imagem, com um pirata e um ninja, existente em todo o universo. Encontrei-a por acaso, uma feliz coincidência cósmica, no Flickr. E isso é infinitamente belo. Não estou a brincar. Com ninjas e piratas não se brinca.

quinta-feira, maio 25, 2006

C'é solo um Figo, tambien

BEST INTERVIEWS
Luis Figo is not only a winger to marvel at, but also the inventor of a new language called 'Italospanportenglish'. When speaking to various journalists, the swarthy star would switch from tongue to tongue, yet still manage to be understood and come across as a good bloke. A humble, if muddled, legend.

Un Capitano, c'é solo un Capitano

Gazzetta Dello 365 End-Of-Season Awards

BEST GOAL
This is an easy one. Francesco Totti took on half the Inter team (on their own patch) from the half-way line, skipping and riding challenges with dexterity and pace, approached the penalty area, avoided another lunge and chipped the keeper from 20 yards to stun the San Siro. Yes, the man is a Roman chav, but is also a calcio genius, and a pleasant, likeable one to boot.


terça-feira, maio 23, 2006

Lord Ass does Almodóvar

Todo sobre mi madre es una buesta. Só vi hoje. Todo mundo é travesti, ou transa com travesti, ou acha no mínimo bacaninha. A única que não gosta de travesti é a mãe da freira, e Almodóvar escreveu BURGUESONA na testa dela com caneta piloto. Parece que ela fez plástica também, e falsifica Chagall, porque ela é bur-gue-so-na. (mais)

Curioso, comecei a pensar se gosto ou não de Almodóvar, passaram dez minutos e ainda não cheguei a nenhuma conclusão. Acho que vi uns seis filmes dele; nenhum deixa grandes memórias. Talvez a actriz do Habla con Ella, era bonita. Acho. Não me lembro bem, vou confirmar. Hmm, o filme tinha uma toureira? Ah, havia duas em coma. Esquece. Penélope Cruz, nem pensar. Sexualidade de mulher alguma resiste à cientologia de Tom Cruise. Não gosto de Almodóvar, mas também não odeio. Não é suposto, imagino, ele deveria ser daqueles realizadores "a que ninguém fica indiferente". Bom, eu fico.

Ah, e às tantas no mesmo post:

E, bom, tem cena de teatro demais. Eu vejo teatro num filme e fico embaraçado, imagina como eu fico no teatro de verdade.

Já há uns tempos que preparava mentalmente um post sobre o teatro. O Alexandre, em duas linhas, atingiu o mesmo efeito que eu procuraria no meio de dez linhas. Enfim. Falta de originalidade confessada, prosseguirei.

Há uns dias percebi que, afinal, é possível não gostar muito de teatro e manter um ar digno e inteligente. Não esquecer que, na grande maioria dos casos, os grandes amantes do teatro são actores de teatro, o que é revelador.

Claro que há boas peças de teatro e, sobretudo, bons textos em teatro. Mas depois há a questão dos monólogos. Quando um actor dá dois passos em direcção ao público e começa a falar sozinho, com o olhar posto no vazio, aí também não consigo de deixar de sentir o tal embaraço de que fala o Alexandre.

É como ter um tio demente que diz uma série de barbaridades à mesa de jantar - a pessoa sente-se embaraçada por ele que, coitado, perde momentaneamente a noção da figura que faz. E está lá o mesmo olhar vazio, a cabeça que pende ligeiramente para o lado, as flutuações de voz. A comparação ainda é mais feliz se levarmos em conta que tanto o actor como o tio se cospem compulsivamente, e ninguém parece ter coragem de chamar a atenção para isso.

Pift-poft, bing, zzzzzjjjmmm, have a little faith in me

falámos sobre Solveig Slettahjell.

O Amor como Salvação? Nunca é boa ideia.

Mas díficil de resistir, a tocar aí ao lado.

sábado, maio 20, 2006

Mais importante do que saber o que é um talonário

É tentar perceber o que está exactamente a fazer a senhora da fotografia deste anúncio.

Sábado à Tarde

Encontro com o meu bisavô nos alfarrabistas do Chiado:


Sobre um dentista chegado à capital anuncia pomposamente: «He chegado a esta corte Carlos Castiglione Professor Dentista, italiano de Nação. Tira as molas, e as raizes, ou dentes soltos, e podres com huma ligereza sem igual, ainda que impossibilitados a qualquer outro Professor. Tendo também hum pós de sua especial, e propria composição, que deitando-se sobre o dente, ou molla arruinada, a rende muito facilmente para a sua extracção; Tira dentes sobrepostos, ou cavalgados, endireita os torcidos, e os poem em são ser natural; e aos que tem covas e estas enche de ouro, e prata, chumbo, alimpa-os, e os poem claros, ainda que estejão mais negros que hum chapeu.» [Hebdomario Lisbonense, 1763]


Seguido por um cappuccino numa esplanada, polvilhado com algo que parecia ser nesquik, mas acompanhado por um cara a tocar uma bossa nova legal. Do alto da minha boa disposição até lhe perdoei quando ele disse que o Samba da Benção era do Jobim. No entanto, preocupa-me que os alfarrabistas tenham cada vez menos cara de alfarrabistas.

quinta-feira, maio 18, 2006

«Amor Desculpa Viu? Te Amo Leia Esse Cartao»

Os spammers estão cada vez mais agressivos.

Post melindrado

Hoje é o Dia Internacional dos Museus. Este fim-de-semana os museus estão abertos até mais tarde, têm actividades programadas, entradas livres, chás dançantes - um fartote para museófilos, se isso existe.

É também hoje que o Museu Nacional de Arte Antiga inaugura a exposição da colecção de Gustav Rau - De Fra Angélico a Bonnard -, que vai estar em cartaz até dia 17 de Setembro.

O Dia Internacional dos Museus deste ano é dedicado aos jovens e, de acordo com a directora do MNAA citada na imprensa, nesse sentido o Museu vai organizar uma festa nos seus jardins até às três da manhã. Excelente. Quando soube da notícia pensei «que país evoluído nos estamos a tornar», já que associava festas em museus a cidades civilizadas como Londres.

Depois disseram-me que no ano passado já houve uma festa destas. E que era preciso convite. Parece então que um grupo selecto de "jovens" vai celebrar o Dia Internacional dos Museus, nos lindíssimos jardins das Janelas Verdes, pelos outros jovens (sem aspas) que não têm a sorte de conhecer alguém que conheça alguém que conheça alguém que conheça o Manuel Reis. Ou que não trabalhem ou conheçam alguém numa agência de comunicação/publicidade/design/branding/media/marketing/eventos/espectáculos/ranchos, não de viagens ou seguros.

Eu talvez até arranjasse um convite através de vários amigos que trabalham em agências de comunicação/publicidade/design/branding/media/marketing/eventos/espectáculos/ranchos, não de viagens ou seguros. Mas, 1 - estou cansado para tentar ver um Fra Angelico no meio de gente com sapatos cujas marcas eu não consigo identificar, 2 - gosto de me sentir melindrado.

Gostava também que alguém me dissesse que afinal não era necessário entrar com convite. Bastava chegar à porta e dizer o que tinham em comum o pintor Fra Angelico e o pintor Beato Angelico.

A sério, eu ando a tentar

Primeiro foi Fátima, agora é a Opus Dei em alta operação de charme, o Código de Da Vinci por todo o lado, Dan Brown e um segredo tão chocante como pateta - Cristo deixou linhagem (dois mil anos de falsas verdades católicas? o horror, o horror!) - e eu não escrevi nada sobre isso, nada a ver com isso, nada mesmo.

Aliás, bom é descontrair, ouvir um disco, ler qualquer coisa, assistir a um filme, fazer festinhas e dar bejinhos a alguém. Ou ver a última coisa que o Jay Pinkerton fez para a Cracked.com, por exemplo. Deixo-vos um excerto. Artigo completo aqui:



terça-feira, maio 16, 2006

Dois versos dedicados à melhor personagem do Lost

Ex-warlord badass turned catholic self-made priest
Step out of line and he'll beat you with his Jesus stick

Mr. Eko

I realize that you live in a world where righteousness and evil are very far apart, but that is not the real world.

Long before time there was a king named Josiah, and this king was a good king. Do you know this story?

I read the news today oh boy

A Lua É Uma Meretriz Dos Diabos

É preciso ter cuidado quando se escreve sobre fumar um cigarro e olhar para a Lua. É preciso muito talento e, não me sentindo à altura, vou passar essa parte. Mas posso dizer que voltei da varanda com vontade de pôr esta música a tocar aqui.

The Moon Is A Harsh Mistress, numa versão que junta o Pat Metheny e o Charlie Haden em Beyond The Missouri Sky de 1997. Dois maníacos do jazz, sedados e rodeados num estúdio em Nova Iorque por instrumentos acústicos, memórias das paisagens do Missouri e vinte dedos que percorrem canções memoráveis (o tema de amor do Cinema Paradiso, por exemplo).

The Moon Is A Harsh Mistress é uma composição original de Jimmy Webb. Acho que o Joe Cocker tem uma versão lá para os anos setenta, que nunca ouvi. Aqui há uns meses encontrei uma cantada por uma tal Tomi Damli Aaberge. Depois disso decidi nunca mais ouvir esta música pela voz de ninguém. A seguir à Guitarra do Metheny e ao Contrabaixo do Haden não há Tomi que se possa aguentar. Não são necessárias palavras para perceber.

A tristeza do tema parece que vai evoluindo para um certo optimismo, ainda que melancólico, com os dois instrumentos a insistirem em parecer desencontrados. E depois há a particularidade de, no meio desta sensação de crescendo, a harmonia diatónica descer um meio-tom, e depois outro; embora não tenha bem a certeza se me faço entender ou se eu próprio percebo do que estou a falar.

Em 2003 ouvi-os a tocar o tema ao vivo num auditório em Roma. Não foi nada fácil.

segunda-feira, maio 15, 2006

Este blogue não tem coerência editorial

domingo, maio 14, 2006

:-)

Através do vidro duplo:

A indústria de cosméticos bem pode investir em I&D que nunca encontrará melhor exfoliante do que uma barba por fazer.

É refrescante encontrar um post assim depois de andar a esbarrar em blogues de corações partidos e escrita ressabiada.

Sim, sim, eu sei; atire a primeira posta aquele que nunca ressabiou em blogue.

*primeira e única vez que usarei um smiley no Achtung.

Piada geek no Conan O'Brien:

Twenty years have passed since Chernobyl...

...still no superheroes?

Era um stand-up inglês, não me lembro do nome - mas muito engraçado.

sexta-feira, maio 12, 2006

A Midspring Blogger's Nightmare

Married to the Sea
(in www.marriedtothesea.com - genial)

quarta-feira, maio 10, 2006

Take my test, bitch

Andre's Best Personality Test EVER! (click it)

Why am I writing this in english? I don't know, I'm kind of tired.

Dicionário de Expressões de Grupo - II

Dear John - fig. Carta, ou qualquer tipo de missiva escrita, em tom querido e/ou simpático usada para terminar uma relação, caso, ou possibilidade dos mesmos. Os autênticos Dear Johns são aqueles que conseguem veicular extrema simpatia e carinho pelo receptor, ao mesmo tempo que passam com eficácia uma mensagem de desfecho e corte de relações. Por norma seguem a regra 10 + 1: dez linhas de elogio para cada uma de justificação do fim.

ex. de utilização: «Acordei na manhã seguinte e tinha um Dear John em cima da mesa» ou «Deixei-lhe um Dear John debaixo da almofada».

Dicionário de Expressões de Grupo - I

Ir ao Mac - fig. Envolvimento físico casual (geralmente de uma noite) com um(a) ex-namorado(a). É fácil, acessível, custa pouco e sabe bem; mas é quase sempre seguido de uma leve sensação de mal-estar.

segunda-feira, maio 08, 2006

Achtung Music

O que terá acontecido aos Third Eye Blind? Não sei e não me interessa.

Mas este How's It Going To Be servia para mostrar que os restos do grunge até podiam combinar com melodias agradáveis, e que havia rapazes inteligentes que tinham tirado as devidas lições do (grande) rock que se fez na década de 70. A prova é a respeitável homenagem que se faz no fim da canção a esse portento dos The Who - Baba O'Reilly.

Em baixo, à entrada da Saatchi Gallery, um lírico pondera sobre como é que vai ser.

sexta-feira, maio 05, 2006

Quote of the night

«I like you and if you can't deal with that you should... fuck off.»

Mark Corrigan, "Peep Show"

Achtung Music

É que vem aí o fim-de-semana e só me ocorre dizer isto:

5, 6, 5, 6, 7, 8

All these beats
walkin' down the street
jumping, jacking
gimme some time
'cause if you don't, I won't
you'll never get back, yeah
if you do, I swear
I'll give it to you

standing on the board
the board is on the wheels
wheels are on the ground
spinning round and round

I got the power
back here
all you gotta do
i got the power
back here
gimme some time

i got here, where?
i got there, where?
i got it
you got it
we got it everywhere
Ok

get all your loser heads up
Ok
try to pick up the junk
Ok

Yay


Yay.

terça-feira, maio 02, 2006

Chama-me nomes

Já há alguns dias referiram-se a mim como Dédéu. Há pouco tempo alguém também me disse que eu não tenho cara de André. Talvez tenha cara de Dédéu, ou então de parvo - a verdade em forma de diminutivo?

Ao longo de 26 anos já tive cara de muita coisa. De André já passei a Androcas, Andé, Andrezinho, Andrezito, Andrequita, Andrea, Andrew ou Andy. Os mais extremistas chegaram mesmo a requintes de Dé, Dedé, Dudu, Drocas. E o Dédéu acima referido, claro. Lembro-me agora que havia um professor de condução que me chamava Tiago com alguma regularidade.

Depois há as variações do apelido, pano para mangas: Lapão, Lapôncio, Lapónio, Lapini, Lapovski, Lapinski; há pouco tempo tentei introduzir Lapameister, mas ninguém parece querer aderir - culpo a falta de informação na nossa sociedade.

Todos estes nomes são minimamente aceitáveis ou, quanto muito, contextualizáveis. Em relação a alguns sinto até bastante afecto. O que nunca conseguirei justificar é a tendência, ocasional e de outros tempos, para já me terem saudado com um "olha o Peter Andre!". Enfim.


segunda-feira, maio 01, 2006

Get into the swing

Lux, Bar, 29 de Abril.

-Vais a Kings of Convenience?
-Infelizmente, não.
-Importavas-te de ir sozinho?
-Claro que não.
-Não vou poder ir, toma.

Foram mais ou menos assim as primeiras palavras que troquei com a Mariana na madrugada de Sábado. A Mariana que vai estrear a peça "Cuidado Com o Que Desejas" esta quinta-feira no Teatro Bocage. A mesma Mariana que pode ser ouvida a tentar devolver algum improviso à noite lisboeta, na sua parceria cantante com os vinis do DJ Señor Pelota, ou lida à procura de qualquer coisa no huntingideas. A Mariana que, como é óbvio, não pediu esta promoção e puxa-saquismo descarados, mas sofre pelo facto de lhe estar grato por me ter proporcionado o prazer de ver dois dos nerds mais interessantes da música actual.

Kings of Convenience, Aula Magna, 29 de Abril, Doutorais.

A bilhete dado não se olha o lugar, diz o ditado, mas melhor era díficil. Para ser mais específico, melhor só mesmo duas filas à frente, já que fiquei sentado numa das tais poltronas doutorais da terceira fila. E para quem não sabe a Aula Magna tem das melhores acústicas das salas de espectáculos de Portugal, disse-me aqui há cerca de 7/8 anos a guitarra Picasso do Pat Metheny.
O ambiente estava muito bom. Não vi mais do que três pessoas com cara de más-pessoas (todas mulheres) e, tirando algum exagero nos vestidos hippies e penteados catalá-estilo, estava toda a gente muito bem apresentada e com um ar feliz. É importante ver pessoas felizes num concerto, no dia em que isso deixar de acontecer, aí sim, poder-se-à falar de crise dos valores ocidentais.

Como já aqui foi referido, sou um fã recente dos Kings of Convenience. Isso explica o facto de não ter levado um coração desenhado numa folha para ir mostrando à banda, como fazia uma miúda sentada na fila à minha frente. Para a próxima já não me apanham em falta.

Mas não foi a primeira vez que vi os KOC (um acrónimo perigoso) ao vivo. A meio do concerto lembrei-me que já tinha visto os dois noruegueses no hype@meco de 2002. Na altura achei despropositado aqueles dois totós de guitarras acústicas no palco de um festival de dança, falhou-me a requintada ironia do esquema cósmico das forças do universo - algo que me acontece com frequência, devo confessar.

Parece-me que este post vai ficar bem grande, o que significa que pouca gente o vai ler até ao fim ou mesmo que já tenha chegado até aqui. É a chamada armadilha do post intimista. Adiante.

Os Kings of Convenience são aquele tipo de grandes músicos que disfarçam o facto de não serem grandes músicos com o facto de que talvez sejam mesmo grandes músicos, mas que isso não é muito importante. Também disfaraçam o facto de não serem grandes letristas com o facto de que talvez sejam mesmo grandes letristas, mas que o importante é que as frases entrem dentro da cabeça do ouvinte de forma fragmentada e de repente façam todo o sentido. É essa a essência da música pop e eles são pop, bom pop. Pop, pop, pop, não se deve ter medo da palavra Pop. Pop, pop, pop.

Por exemplo, logo na primeira música, "Until You Understand"; as luzes baixam, o público aplaude, eles assentem o reconhecimento, e começam a tocar as violinhas. Fiquei um bocado desiludido por ninguém se ter sentado ao piano, reconheço, mas depois deixei-me de ressentimentos. A conjugação das duas vozes, a do gajo giro que canta mais, com a do nerd magricela e grandalhão dos óculos (nordicamente impecável, andou pela plateia, disse piadas, tocou trompete de boca, falou de barreiras e distâncias) é assombrosa. Eles terem começado a cantar juntos é semelhante à invenção da roda: algo simples, genial e infinitamente bonito. E no final de Until You Understand, foi logo evidente em:

I wish the only thing I had to do was to
hold my arms around you.
So long, so hard,
until you understand.


Tenho uma certa facilidade em distrair-me enquanto estou a assistir a um espectáculo. Teatro, concerto, a ocasional ópera; às vezes dou por mim a pensar em coisas tão interessantes como o porquê da expressão "morte da bezerra", p.ex: por que é que os activistas dos direitos dos animais nunca vieram defender o direito de alguém pensar na "morte da bezerra" sem incorrer na reprovação da sociedade? Durante muito tempo vivi complexado com este facto (o de me distrair, não a questão da bezerra), até ter percebido que não havia problema nenhum nisto, e que uma peça de teatro enfadonha encenada por alguém não-respeitável merece tanto da minha distracção como as aulas da minha respeitável professora de Grego Clássico no Secundário.

Durante o concerto deu-me para pensar na vida, no último ano, em Londres, nos novos desafios, com as suas entusiasmantes angústias e ligeiras ansiedades. Deu-me para pensar que C. me acusou de ter commitment problems (C. é americana), ou que C. me dizia que eu sou um lírico (C. é portuguesa). Nisto enquanto me entravam e ressoavam na cabeça as lindíssimas melodias cantadas e tocadas por Erlend Øye e Eirik Glambek Bøe. Como o recado nostálgico da bossa em Love is No Big Truth,

A memory of the cushion life
I'm clinging to.
The image of a mutual one, our haven.


a ignorância dissimuladamente jovial que pergunta I don't know what I can save you from, ou o optimismo apaixonado que promete you'll shine like gold in the air of summer. Tudo muito acústico, mal iluminado, bonitinho, a propiciar que um tipo ficasse ali enterrado na poltrona a pensar nas coisas boas da vida, e que mesmo as coisas menos boas da vida teriam alguma coisa de bom.

E onde é que estava o piano no Misread? Não estava, tocaram o riff na guitarra, e muito bem. A mensagem foi simples, e eu percebi: se queres ouvir o piano ouves o disco em casa.

O piano aparecia de vez em quando, embora menos do que devesse, a guitarra de cordas de aço do Øye revelou-se nada irritante - ao contrário do que eu temia -, e o alemão que tocava violino e o italiano de bigodes que produziu o disco e tinha um bello baixo acústico de cinco cordas compunham ainda de melhor forma o cenário da Aula Magna.

O público português, coitado, tentava comportar-se de forma devida (afinal, estava ali o modelo nórdico) mas, depois de ir entrando quando o concerto já tinha começado, lá começou a bater as palmas. Bater palmas num concerto acústico, numa sala com boa acústica, é um atentado. Quem gosta de bater palmas quando ouve música são os bebés, e embora eu não vá fazer piadas com a idade mental da audiência, gostava de notar que partilhamos com os espanhóis este gosto pela palma fácil. A única diferença é que os espanhóis sabem bater palmas ao ritmo da música, o que não aconteceu muitas vezes no Sábado - como notou o norueguês grande dos óculos.

O que não tinha óculos às tantas tocou e cantou o Corcovado do Jobim, num português bem decente. Depois disse que era intimidativo fazê-lo perante uma audiência portuguesa e perante tanta boa-vontade perdoei-lhe a rasteireza daquele Corcovado; que eu teria feito com semelhante perícia, o que não é um elogio.

Já tinha passado mais de uma hora quando o sempre fixe caixa-de-óculos teve a grande ideia de chamar a plebe das galerias para que se aproximasse do palco. Passados dois minutos a banda tinha aí umas setenta pessoas em cima do palco. Parecia um daqueles espectáculos dos Up With People, um desastre. Tive de me levantar e subir para cima do palco, mas o que vale era que as pessoas tinham todas cara de boas pessoas, e teve a sua piada dançar o I'd Rather Dance With You no palco com a banda. Quase tanta piada como a tensão que emanava do violinista alemão, cercado num palco por selvagens do sul da Europa. Infelizmente as pessoas não abandonaram o palco, mas sentaram-se, o que possibilitou o meu regresso ao conforto reflexivo da poltrona doutoral.

Já para o final do concerto, o sempre poético e descontraído Erlend Øye teve o descaramento de anunciar que ia tocar uma música para "someone who is very far away". Depois, naquela voz descomplexada, de homem quem assume o seu lirismo, começa a cantar o Waiting In Vain do Bob Marley. "How's that for a reflexive moment", não pude deixar de pensar, assim em inglês e tudo. Waiting In Vain foi uma das canções que precedeu a minha partida para Londres, que acompanhou a minha estadia em Londres, e que ainda pairava no ar quando voltei de Londres. Depois disso esvaeceu-se, e Sábado foi outra vez dedicada a "someone who is very far away"; para depois ir directo para casa, que uma noite assim não se deve desperdiçar em vão.
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