Algures aí em baixo está um
post (desculpem os puristas da língua portuguesa, mas não consigo escrever poste, ou posto, sem rir) sobre a globalização. Nem é bem um
post sobre globalização, mas sim um
post sobre um
post sobre um texto sobre globalização. Ou sobre parte desse
post, pelo menos. Pelos vistos há um engenho muito útil que se chama Technorati, que permite, entre outras coisas, que se descubra quem é que anda a lincar quem (lincar já consigo escrever só com um esgar de gozo) na internet. É o fim da promiscuidade, mas uma ferramenta muito útil, sem dúvida. Útil porque permitiu ao
autor do post original ler o meu texto (a única pessoa que o fez, porque nenhum dos visitantes habituais deste blogue lê mais do que dez linhas, e mesmo eu não o reli), o que lhe despoletou uma pronta e estatistico-política demolidora
resposta. Gosto sobretudo do modo como o autor agarra a minha expressão "outro modo" e a trucida, esquarteja, mutila, de trezentas maneiras diferentes. Já não gosto de ter ficado a parecer um apoiante de Ana Drago, que, sinceramente, nem sei muito bem quem é. Tenho a vaga memória de a ver discutir a questão do aborto com um padre histérico na televisão, e de não ter ficado lá muito bem impressionado com as suas capacidades de argumentação. Se o padre fosse jesuíta ainda se percebia, porque com esses não se brinca, mas acho que nem isso - era mesmo só histérico.
Resolvido isto vamos ao que interessa. O MacGuffin lá terá as suas ideias sobre a globalização. Não acho, nem me parece que o tenha dito, que sejam resultado de uma qualquer confusão que faça reino da sua cabeça. O que me parece é que, seja ao defender as suas ideias, ou ao tentar demolir a dos outros, o MacGuffin agrupa as pessoas em pró e contra a globalização. Tipo, ou estás connosco, ou vai lá partir montras de MacDonald's com os outros maluquinhos. Depois há um tom eloquente que envolve todo o post e que vocifera contra os inimigos do capitalismo. Não é isso que me parece que esteja em questão. Eu não sou contra o capitalismo, o Dr. Soares também acho que não, o Bono (que é "nojentamente" rico à custa do capitalismo) também não me parece que seja, e a Ana Drago não faço a mínima ideia, nem me interessa.
Quando digo que ela «pode ser feita de outro modo» é por acreditar, sem ser especialista na matéria (porque não disponho de centenas de euros para gastar na Fnac em livros sobre o assunto), que dentro das tais regras do sistema se podem fazer as coisas de maneira diferente. É isso que defendem as pessoas acima referidas. Se o MacGuffin acha essas teses delírios de gente mal-informada tudo bem. Nunca escrevi aqui que se devia reverter o processo da globalização à estaca zero. Nem consigo conceber como é que isso seria possível. Também acho que não devemos ser ingénuos ao ponto de acreditar que os países ocidentais acabem da noite para o dia, como diz o MacGuffin, com as «hipocrisias» (as aspas são minhas), mas já se viu governos a acabar com coisas também pouco prováveis. Aceitar o cinismo do mundo e a inevitabilidade do sistema capitalista, tal e qual ele parece funcionar bem, não é uma escolha consensual limitada aos iluminados deste mundo. Não são só os Bonos, os Bloquistas e os Soaristas desse mundo que acreditam nisso. O ex-nobel da economia Joseph Stiglitz fala sobre isso no seu
Globalization and its Discontents. Já o li há um par de anos, e não o tenho aqui para confirmar, mas não me lembro que incentivasse que se voltasse à estaca zero, nem que deviamos todos comprar os lenços do Arafat e t-shirts do Ché Guevara. Mas, provavelmente, Stiglitz estava mais interessado em promover o seu último trabalho discográfico: um álbum de covers de Arnold Schoenberg em banjo. A extensão com que se acredita dever, ou poder, mudar o sistema é variável de linha de pensamento para linha de pensamento, mas desacreditar (com base num relatório do Banco Mundial) todos aqueles que se atrevam a sugerir «vias alternativas» como produtores de «conversa de treta» parece-me uma observação de treta.
Depois há a questão dos artistas. Esses «impolutos paladinos», esses «mosqueteiros», esses, esses, esses «artistas»! Ao que parece esses «artistas» não podem ter opinião sobre as coisas. Já falei no outro post sobre o que o Bono anda a fazer. Acho que não vale a pena repetir, porque esse ponto não foi abordado na resposta. Defendi-o porque, mesmo que não concordemos com ele, acho que abre uma excepção muito marcada no que tem sido o activismo político do
showbiz. Porque, e não está sozinho nesse aspecto, estudou, viajou muito, e viu coisas que dificilmente um «civil» poderia ver. Porque sim, porque é uma estrela e tem privilégios que muitos não têm, e que acaba por canalizar parte desses privilégios para ajudar uma causa em que acredita. E isto está tudo documentado. Eu acho que tem mérito por isso, e que é redutor, fácil, e demagógico, usar os «artistas» como sacos de boxe para promover determinados pontos de vista. E sim, muitas vezes são eles que são redutores, fáceis, e demagógicos, e gostam de generalizar sobre a classe política em geral; mas isso também não implica que se generalize sobre eles. É isso que eu acho que o David Brooks e o Contra-a-Corrente deviam perceber.