quinta-feira, dezembro 30, 2004

Bring it on

2004 foi um ano de viragem. De fins, de inícios, de humildade. Não aquela humildade no sentido pio, ou de comiseração, quando se diz que alguém (geralmente a empregada doméstica velhinha e eficiente) «é uma pessoa muito boazinha, muito humilde». Falava da humildade socrática (Platão tinha um tipo de amor, Sócrates ficou-se pela humildade), no sentido de perceber que, precisamente depois do curso universitário, agora é que nos deparamos ainda com uma maior imensidão de coisas para aprender, apreender, pensar.

Quase diria que a universidade não nos prepara para o mundo; quanto muito acaba por abrir um mundo inteiro de possibilidades. Como a possibilidade de nos permitir escrever uma frase do género da anterior e ficar agoniados, tendo de ir vomitar bocadinhos de ponto e vírgula - incrustados em «mundos inteiros de possibilidades» - pela janela. Ou a possibilidade de escrever textos na terceira pessoa, quando nos referimos a nós próprios. A mim próprio. A eles próprio. Argh. Vocês perceberam. E isto é tudo um bocado para o assustador, sim (ter de pensar em pensar assusta), mas entusiasmante.

Desculpem lá este desabafo da humildade. Sei que seria bem mais interessante falar de inícios e fins, mas agora já não temos tempo. Entretanto, parece que vem aí um ano muito interessante. We'll keep you posted.

A todos um óptimo ano novo.

«The Fuhrer does not say Achtung Baby!».

quarta-feira, dezembro 29, 2004

Agora escolha

«Os homens que têm a mania das mulheres dividem-se facilmente em duas categorias. Uns procuram em todas as mulheres a ideia que eles próprios têm da mulher tal como ela lhes aparece em sonhos, o que é algo de subjectivo e sempre igual. Aos outros, move-os o desejo de se apoderarem da infinita diversidade do mundo feminino objectivo.
A obsessão dos primeiros é uma obsessão lírica; o que procuram nas mulheres não é senão eles próprios, não é senão o seu próprio ideal, mas, ao fim e ao cabo, apanham sempre uma grande desilusão, porque, como sabemos, o ideal é precisamente o que nunca se encontra. Como a desilusão que os faz andar de mulher em mulher dá, ao mesmo tempo, uma espécie de desculpa melodramática à sua inconstância, não poucos corações sensíveis acham comovente a sua perserverante poligamia.
A outra obsessão é uma obsessão épica e as mulheres não vêem nela nada de comovente: como o homem não projecta nas mulheres um ideal subjectivo, tudo tem interesse e nada pode desiludi-lo. E esta impossibilidade de desilusão encerra em si algo de escandaloso. Aos olhos do mundo, a obsessão do femeeiro épico não tem remissão (porque não é resgatada pela desilusão).»

Milan Kundera, A Insustentável Leveza do Ser

2004

Já que anda toda a gente numa de prémios, balanços, e coisas rotas do género, também deixo o meu contributo. Não dos melhores do ano em si, porque as minhas capacidades de leitura, cinema, etc, roçam os limites de uma vida sã; é mais aquilo que eu gostei e que calhou aparecer-me à frente em 2004. Bear with me, please...:

Melhor livro (em português): Fantasia Para Dois Coroneis e Uma Piscina, Mário de Carvalho

Melhor livro (em inglês): V., Thomas Pynchon

Melhor livro que se tentou começar a ler em inglês (ou prémio What the Fuck?): Ulysses, James Joyce. (ficará para outras alturas, como aconteceu, em tempos, com as Memórias de Adriano).

Melhores filmes: Eternal Sunshine of the Spotless Mind / Kill Bill (conta como só um filme) / Lost in Translation

Melhores discos: Jaco Pastorius Big Band, Vários /Take Me Out, Franz Ferdinand

Boas descobertas, e redescobertas, musicais: Good News for People Who Love Bad News, Modest Mouse /Stevie Wonder e The Cure, cortesia dos respectivos Greatest Hits

Boas coisas que se fazem em televisão: The Office / Gato Fedorento

Melhor compra de DVD: The Big Lebowski

DVD mais esperado do ano: Seinf... não, desculpem, afinal é este: Os Jovens Heróis de Shaolin.

Melhor site: Aldaily.

Melhor blog: Alexandre Soares Silva. Prémio Especial do Júri: O que é 1 blog.

Melhor fantasia sexual: Aquelas três irmãs peitudas de Lisboa...

Pior fantasia sexual: A gerente da companhia das sandes do centro comercial perto de minha casa...

Pior viagem de carro: de Buda para o centro de Peste, guiado por um xamã alemão que ouvia trance psicadélico aos berros enquanto alucinava em cogumelos, insistindo que fazer inversão de marcha por cima das linhas do eléctrico do centro de Budapeste era uma óptima ideia.

Melhor capa de jornal desportivo: Marca


E, depois de mais um ano, o Lux continua a ser o único sítio decente para sair à noite em Lisboa. E isto não é, necessariamente, algo bom. A melhor noite? A festa do intragável Absolut Vanilla. Só mesmo misturado em cocktails de fruta fresca é que se safava, mas lá que foi uma grande festa foi sim senhor.

Fica sempre a sensação de se estar a esquecer de imensas coisas. Pode ser que seja do cansaço...

Bom dia!

sometimes I stay up really late being bored

Ivgeny Ivgeny's Laika

Ideia para filme #23

Sinopse: Drama de ficção científica, centrado sobre a díficil vida de Laika, a cadela espacial, depois do regresso do Sputnik II à Terra.

Personagens:
Laika - depois de um ano de fama e digressões internacionais, a cadela entra num estado de profunda depressão. A sua esquizofrenia cedo se torna num vórtice de angústia que, eventualmente, acaba por absorver tudo e todos que a rodeiam. No final, trágico, tentará escalar as torres do Kremlin e esganiçar as obras completas de Rimski-Korsakov, mas o destino reserva-lhe um destino pior: acaba como professora de esperanto num clube recreativo dos súburbios moscovitas. Papel a ser interpretado por Elizabeth Taylor.

Mikhail Potopotov - o companheiro de Laika. No filme nunca se perceberá se é um homem ou um cão, apenas as subtis alterações do bigode fornecerão as pistas. A ser interpretado pelo barrete de Lenine.

Rumo Zuvo - o pérfido vilão. Criador de dobermans (ou seria dobermen?, nunca o descobrirá, o que aumenta incrivelmente a sua angústia); inimigo fidagal da cadela Laika, nunca recuperado do trauma de ter sido preterido a favor da cadela astronauta na viagem à órbitra terrestre. A ser interpretado por Mick Jagger, usando uma pala no olho direito e um anão amarrado à sua perna esquerda, como adereços.

Natacha Smirnoffa - Amante de Rumo Zuvo, mas amiga secreta de Laika. É ela que, num momento inesperado, irá pôr sal a mais na comida de Zuvo, provocando-lhe uma crise de diverticulite e, consequentemente, a cena mais engraçada do filme. A ser interpretada por Boy George.

Sputnik II - a nave que levou Laika ao espaço. A sobreexposição aos raios cósmicos e a demasiados ciclos de cinema de série B americana auferiram-lhe estranhos poderes. Consegue escapar do centro espacial russo sob a forma de uma dançarina de flamenco. Eventualmente casará com Pol Pot, e far-lhe-à da vida um inferno. A ser interpretada por Margaret Tatcher.

Retirado de Excertos Para Uma Vida de Filmes e Deboche, Ivgeny Ivgeny (1987)


terça-feira, dezembro 28, 2004

Madona...


(Edvard Munch)

segunda-feira, dezembro 27, 2004

O Sacana

«Tu és um bocado sacana...». Disse-lhe ela.
«Um sacana, eu? Ah... um sacana...». Cogitou A., por entre uma multidão indistinta de meninos de Cascais e cabeleireiras da linha, num ambiente pouco natalício de funky disco.

Ser um sacana não é necessariamente uma coisa má, pensou A. O priberam define sacana como biltre, patife. No entanto, para A., existem algumas diferenças. O biltre, ponderou, é um tipo desprezível, baixo, mesquinho. Alguém pouco recomendável. Já o patife, supôs A., é alguém dado a patifarias. A golpes baixos, ao engano do próximo.

Ora, o sacana é diferente. Como em «ó meu granda sacana, venham de lá esses ossos». O sacana faz as suas sacanagens, mas não é necessariamente uma pessoa má. O sacana não causa grandes estragos. Claro que há sacanas e sacanas, mas toda a gente tolera um bom sacana. O bom sacana faz rir os outros, e, sobretudo, é um gajo que se fica a rir.

A. acordou tarde no dia seguinte. Tinha a boca seca, doí-lhe a cabeça e, sobretudo, não tinha vontade nenhuma de rir.

quinta-feira, dezembro 23, 2004

Immigrant

You burn my flame within your hands
You know when my destiny falls
This time has insecurity
I feel, makes me restless inside
Will you take me there
To a distant place I’ve never been before
I could leave this world
I could follow you like oceans to the shore
You could take me there
Make the rivers of my mind flow to my dreams

You hold your secrets from my eyes
You see where the furthest rain falls
The day breaks over in the streams
You know where my rivers will flow
Will you take me there
To a distant place I’ve never been before
I could leave this world
I could follow you like oceans to the shore
You could take me there
Make the rivers of my mind flow to my dreams

And I dream of places far from here
And I call your name to the wind
And I wish the night would take me to another world
Where no one knows a face or has a name
Will you take me there
To a distant place I’ve never been before
I could leave this world
I could follow you like oceans to the shore
You could take me there
Make the rivers of my mind flow to my dreams

Make the rivers flow
Will you take me there
Will you take me there
(Nitin Sawhney, Beyond Skin - sim, sim, a letra é um bocado banal, mas a voz, a voz... não há banalidade que aguente. E é quase Natal.)

quarta-feira, dezembro 22, 2004

A conversão de Martino Cepillo

Crentes de todo o mundo regozijaram-se ontem com o anúncio da conversão à fé católica por parte de Martino Cepillo. Fizeram-no entoando sublimes cânticos em dó menor, tocados em violas com transpositores, e mastigando copos de vidro. Para os mortais menos atentos – ou aqueles que gostam de sair à noite e apreciam o contacto físico com mulheres voluptuosas (ainda que não distingam uma cotovelada de um convite à proximidade corporal) – Martino Cepillo era um dos grandes porta-estandartes do ateísmo mundial. Publicado em sete línguas, três dialectos e na língua dos pês, a sua obra é caracterizada pelo feroz ataque à fé e às religiões, e pela insistência em escrever deus com letra minúscula. Os círculos do Vaticano classificavam-no de «infantil e sem substância»; Cepillo limitava-se a responder – «va fancullo padre di merda». Recorde-se que, já com 17 anos, Cepillo descia a Via dei Fori Imperialli e atirava com bocados de coluna dórica aos transeuntes que cheiravam a missa. À noite esgueirava-se pela praça de S. Pedro e levava para casa a espada da estátua de S. Paulo, que trocava todos os domingos, na feira de Porta Portese, por boletins usados de totoloto.

Agora, com 89 anos, anunciou a sua negação das crenças ateístas ao mesmo tempo que abraça a fé católica e, com esperança, algumas carmelitas. Disse-o a um amigo, durante um duelo com sopas de espinafre ao longo de um almoço em Villa Borghese. No fim do refeição já não se lembrava do nome do amigo, nem da sopa de espinafres, mas acenava convictamente com a cabeça quando o outro lhe perguntava ser era verdade que agora era católico. À saída do restaurante fez questão de abrir o sobretudo e exibir os genitais a um grupo de estudantes de liceu que passavam, sempre acenando de forma convicta com a cachimónia, chocando-os com a imagem da sua dentadura amarelada pela nicotina e pontilhada de espinafres. Pouco tempo depois o amigo perdeu-o de vista porque, ao descer a Via Veneto, Cepillo entrou aleatoriamente num carro que estava parado e pediu para ser levado ao fórum romano, já que tinha assuntos importantes a tratar com Marcus Lipius. Algumas horas depois o filósofo foi visto enrolado na coluna de Trajano, que abraçava com vigor, deslizando subtilmente em seu redor. Demorou algum tempo até que a polícia o conseguisse remover do local, já que Cepillo insistia que tinha de encontrar «um particular relevo, recomendado por Lipius, cujo toque indiciava uma sensação muito semelhante à de acariciar um mamilo de uma vestal».

A coluna de Trajano ou uma alcunha ao alcance de poucos

terça-feira, dezembro 21, 2004

Três, a conta que Bruno fez

Ao que parece o jogo entre o Benfica-Oliveirense - no início da segunda parte neste preciso momento - ainda não chegou ao fim dos noventa minutos e já está a ser resolvido pela marcação de grandes penalidades.

A não perder, oh sim, oh sim, a NÃO PERDER

A NÃO PERDER
24 - último episódio, dia 22 às 22:30h
The Office - especial de Natal, sábado, dia 25, às 22:30h
Pavarotti, o último dos tenores - sexta-feira, dia 24 ás 22:30h (este podem perder)
Do Céu Cai Uma Estrela - sábado, dia 25 às 23:30h
(www.rtp.pt)

A 2: vai passar o The Office Christmas Special

Mas quando? Quando!?

E será que o vídeo ainda funciona?

One night stand

Era só o que faltava: aparecer-me, agora, a Sarah McLachlan na televisão. Com um vestido brilhante, tipo reveillon, em tons de azul cobalto, a fazer festinhas na guitarra e a mostrar como é que se tem um vozeirão que nunca passa os picos da candura e do bom gosto. E quando ela pende a cabeça ligeiramente para os lados, semicerra os olhos, encolhe os ombros ao piano, morde os lábios com ar de malandra ou faz caras de menina apaixonada? Apetece levar para casa e abrir garrafas de vinho. Apetece fazer-lhe festinhas no cabelo e dar-lhe beijinhos nos ombros, entre outras coisas foleiras, enquanto ela diz que o amor é tudo; enquanto ela fala do medo de amar ou do que é encontrar o amor no mundo, sem um pingo de foleirice.

E depois dar-lhe um abraço do tamanho de todas aquelas noites. Desde aqueles primórdios da internet, quando ainda havia paciência para discussões em newsgroups, em que um canadiano aspirante a poeta de haikus me recomendou o Solace e o Fumbling Towards Ecstasy. A música da cantora canadiana será sempre sinónimo de incursões por noites dentro; sozinho, acompanhado. São presenças na minha discografia que se tornam difíceis de associar a períodos específicos. Pela multidão de noites, de sensações, de cheiros, de sentimentos.

E agora, nesta precisa noite, aparece-me a Sarah McLachlan na televisão. Uma senhora artista de palco. Deslumbrante com uma guitarra nas mãos. Doce no piano. Verdadeira na voz.

Os discos continuam na prateleira até qualquer outro dia; mas foi mais uma noite inesquecível.
Beijinhos.

domingo, dezembro 12, 2004

Complicado?

Complicado é tentar viver com o ordenado mínimo nacional. Complicado é viver como aqueles velhinhos daquela série de televisão da TVI, que dá às oito da noite, e que fazem contas a cerca de 80 euros por mês. Complicado é ir a um hospital português amputar um braço e acordar sem os dois dentes da frente. Complicado é tentar negociar com um magrebino que percebe mais de globalização do que qualquer professor de R.I. das universidades portuguesas. Complicado é socializar a ouvir o Song X do Pat Metheny e do Ornette Coleman, enquanto se tenta sorrir e descascar uma castanha de caju. Complicado é explicar a um urso pardo das Rochosas que deve comer o nosso companheiro de montanhismo, e, sobretudo, tentar perceber porque é que anularam o golo ao Sporting. É tentar perceber que tipo de discoteca é que quer ser o People, e entender que é importante que a Kapital exista, já que mantém um determinado género de gente longe das ruas.

E depois há a questão do alter ego. As minhas viagens de táxi podem fornecer algumas pistas.
O é importante é alinhar:

-contra toda a classe política geral
-contra as decorações de natal modernaças, que atentam contra o verdadeiro espírito do Natal, seja lá qual esse for.
-contra a nova geração de futebolistas que é toda muito inferior aos Tonis, Artur Jorges, Humbertos...
-contra aqueles que não querem dar aos taxistas o que eles merecem: uma verdadeira rede de sanitários para todas as suas necessidades. É vergonhoso que continuem a «ir à mata à noite, para arrear o calhau» (sic).
-contra as teses de Derrida sobre a descontrução da linguagem e a tendência dos franceses do sul para a perdigotagem.
-contra aqueles que fizeram o 25 de Abril, aqueles do antes do 25 de Abril, e aqueles que vieram depois.
-contra o grande satã que tudo vigia mas que eventualmente sucumbirá sob a força de Zonan, o grandito, que descerá «numa grande terrina de requeijão, já no próximo dia 29, logo antes do fim do mundo, se tudo correr bem» (sic).

Sim, é verdade, tenho andando muito de táxi.

sexta-feira, dezembro 10, 2004

Mais uma vez, ligeiramente atrasado, mas...

...não podendo deixar em branco que ontem passaram 150 anos desde a morte do homem.

Este inferno de amar

Este inferno de amar - como eu amo!
Quem mo pôs aqui n'alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida - e que a vida destrói -
Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há-de ela apagar?

Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que d'antes vivi
Era um sonho talvez... - foi um sonho -
Em que paz tam serena a dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar...
Quem me veio, ai de mim! despertar?

Só me lembra que um dia formoso
Eu passei... dava o sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? - Não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei...

Almeida Garrett, Folhas Caídas

Então isso quer dizer que

com essa história do Technorati, se eu fizer um link a um post do Pacheco Pereira, um post qualquer, ele vem cá? Pois, se calhar é provável. O JPP aqui? Que emoção. É melhor ir preparar uns canapés, ou assim...

quinta-feira, dezembro 09, 2004

Moving along, moving along (agora com adenda)


Deu para perceber, no contador de estatísticas aqui do burgo, que houve algum incremento de visitantes, devido à (espero que terminada) questão da globalização. Muito bem gente, foi tudo muito bonito, mas já não há nada para ver. Este não é um blog político, nem tem pretensões a tal. Portanto aos mequetrefes farejantes de sangue de polémicas políticas e afins, que vieram aqui parar: toca a andar daqui para fora. Obrigado.

Adenda: o MacGuffin também dá por terminada a questão. E, depois da fase dos encanitamentos, fá-lo de forma elegante, ao mesmo tempo que me passa a considerar «lá da casa». Agradeço e retribuo.

Sheeeeeeeeesh

Algures aí em baixo está um post (desculpem os puristas da língua portuguesa, mas não consigo escrever poste, ou posto, sem rir) sobre a globalização. Nem é bem um post sobre globalização, mas sim um post sobre um post sobre um texto sobre globalização. Ou sobre parte desse post, pelo menos. Pelos vistos há um engenho muito útil que se chama Technorati, que permite, entre outras coisas, que se descubra quem é que anda a lincar quem (lincar já consigo escrever só com um esgar de gozo) na internet. É o fim da promiscuidade, mas uma ferramenta muito útil, sem dúvida. Útil porque permitiu ao autor do post original ler o meu texto (a única pessoa que o fez, porque nenhum dos visitantes habituais deste blogue lê mais do que dez linhas, e mesmo eu não o reli), o que lhe despoletou uma pronta e estatistico-política demolidora resposta. Gosto sobretudo do modo como o autor agarra a minha expressão "outro modo" e a trucida, esquarteja, mutila, de trezentas maneiras diferentes. Já não gosto de ter ficado a parecer um apoiante de Ana Drago, que, sinceramente, nem sei muito bem quem é. Tenho a vaga memória de a ver discutir a questão do aborto com um padre histérico na televisão, e de não ter ficado lá muito bem impressionado com as suas capacidades de argumentação. Se o padre fosse jesuíta ainda se percebia, porque com esses não se brinca, mas acho que nem isso - era mesmo só histérico.

Resolvido isto vamos ao que interessa. O MacGuffin lá terá as suas ideias sobre a globalização. Não acho, nem me parece que o tenha dito, que sejam resultado de uma qualquer confusão que faça reino da sua cabeça. O que me parece é que, seja ao defender as suas ideias, ou ao tentar demolir a dos outros, o MacGuffin agrupa as pessoas em pró e contra a globalização. Tipo, ou estás connosco, ou vai lá partir montras de MacDonald's com os outros maluquinhos. Depois há um tom eloquente que envolve todo o post e que vocifera contra os inimigos do capitalismo. Não é isso que me parece que esteja em questão. Eu não sou contra o capitalismo, o Dr. Soares também acho que não, o Bono (que é "nojentamente" rico à custa do capitalismo) também não me parece que seja, e a Ana Drago não faço a mínima ideia, nem me interessa.

Quando digo que ela «pode ser feita de outro modo» é por acreditar, sem ser especialista na matéria (porque não disponho de centenas de euros para gastar na Fnac em livros sobre o assunto), que dentro das tais regras do sistema se podem fazer as coisas de maneira diferente. É isso que defendem as pessoas acima referidas. Se o MacGuffin acha essas teses delírios de gente mal-informada tudo bem. Nunca escrevi aqui que se devia reverter o processo da globalização à estaca zero. Nem consigo conceber como é que isso seria possível. Também acho que não devemos ser ingénuos ao ponto de acreditar que os países ocidentais acabem da noite para o dia, como diz o MacGuffin, com as «hipocrisias» (as aspas são minhas), mas já se viu governos a acabar com coisas também pouco prováveis. Aceitar o cinismo do mundo e a inevitabilidade do sistema capitalista, tal e qual ele parece funcionar bem, não é uma escolha consensual limitada aos iluminados deste mundo. Não são só os Bonos, os Bloquistas e os Soaristas desse mundo que acreditam nisso. O ex-nobel da economia Joseph Stiglitz fala sobre isso no seu Globalization and its Discontents. Já o li há um par de anos, e não o tenho aqui para confirmar, mas não me lembro que incentivasse que se voltasse à estaca zero, nem que deviamos todos comprar os lenços do Arafat e t-shirts do Ché Guevara. Mas, provavelmente, Stiglitz estava mais interessado em promover o seu último trabalho discográfico: um álbum de covers de Arnold Schoenberg em banjo. A extensão com que se acredita dever, ou poder, mudar o sistema é variável de linha de pensamento para linha de pensamento, mas desacreditar (com base num relatório do Banco Mundial) todos aqueles que se atrevam a sugerir «vias alternativas» como produtores de «conversa de treta» parece-me uma observação de treta.

Depois há a questão dos artistas. Esses «impolutos paladinos», esses «mosqueteiros», esses, esses, esses «artistas»! Ao que parece esses «artistas» não podem ter opinião sobre as coisas. Já falei no outro post sobre o que o Bono anda a fazer. Acho que não vale a pena repetir, porque esse ponto não foi abordado na resposta. Defendi-o porque, mesmo que não concordemos com ele, acho que abre uma excepção muito marcada no que tem sido o activismo político do showbiz. Porque, e não está sozinho nesse aspecto, estudou, viajou muito, e viu coisas que dificilmente um «civil» poderia ver. Porque sim, porque é uma estrela e tem privilégios que muitos não têm, e que acaba por canalizar parte desses privilégios para ajudar uma causa em que acredita. E isto está tudo documentado. Eu acho que tem mérito por isso, e que é redutor, fácil, e demagógico, usar os «artistas» como sacos de boxe para promover determinados pontos de vista. E sim, muitas vezes são eles que são redutores, fáceis, e demagógicos, e gostam de generalizar sobre a classe política em geral; mas isso também não implica que se generalize sobre eles. É isso que eu acho que o David Brooks e o Contra-a-Corrente deviam perceber.

Fez ontem 10 anos

Saravá Maestro António Carlos Jobim. Que seria desta vida sem esse amor, essa canção.

"Som sobre tom"
Texto de Carlos Drummond de Andrade

Abro a janela, e em minha paróquia não visitada por sabiás, um sabiá está cantando. O ouvido não se enganou, e é fácil de explicar. Nesta manhã, um sabiá múltiplo e comemorativo gorjeia em cada árvore de cada bairro do Rio, da Tijuca ao Leblon, pela chegada dos cinquenta anos do sabiá-mor, vulgo Tom Jobim. O pássaro desenvolve um canto geral, em nome das aves amadas por Tom, inclusive o matita-perê, que não nasceu lá muito melodioso, e o jereba, ou urubu de cabeça vermelha, do qual obviamente não se exigem primores vocais. E sua ária festiva é justa homenagem da natureza ao compositor que soube captar para nós, entre canções de amor sofrido ou exultante, a palpitação, o lirismo surdo, o secreto recado das águas de março, das madeiras e lejes que compõem o mais antigo cenário de vida. Cenário que vamos destruindo metodicamente, em vez de preservá-lo e restaurá-lo como opção para o triste viver urbano a que nos condenamos por inclinação suicida.Porque Tom é isso aí: o vibrátil rapaz da cidade, que leva para Ipanema e leblon uma alma ressoante de rumores da floresta, perto da qual ele nasceu. Se ama o papo no bar, com amigos ("a cerveja locupleta os vazios da alma", diz ele), será por invencível delicadeza, que ainda agora o fez declarar a Cristina Lira: "Eu só tenho feito gostar das pessoas". E reconhecendo que "as conversas de bar procuram o longo caminho do equívoco", um dia propôs a um amigo distante "estabelecer sesmarias aéreas" de sociedade com ele. Tom sabe voar sobre miudezas e convencionalismos que atrapalham a verdadeira comunicação, sob aparência de estimulá-la. Se vai aos Estados Unidos, para gravar sua música em nível técnico mais apurado, até nisto segue política de pássaro, que emigra na hora sazonal e volta religiosamente ao habitat na hora certa. E ao voltar, continua tão brasileiro quanto era ao sair, que isso é raiz e sobrenome dele: Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, nos papéis civis. De resto, incriminá-lo de americanização, a mim parece inverter o sentido das coisas. Tom leva para a América do Norte uma límpida, sensível imagem brasileira, que lá nos faz menos desconhecidos e até amados por quem distingue, através da música, o temperamento nacional de que ela resulta. (Exportação cultural, que corresponde ao nosso interesse econômico.)Esse generoso, espontaneo ser urbano-silvestre que é o maestro Jobim representa muita coisa mais do que uma sensibilidade pequeno-burguesa que modula crônicas de amor para consumo da classe média, a que logo adere uma suposta classe alta. É antes um criador musical que concentra o espírito do Brasil antigo, situando-o na atualidade sob condições novas. Estabelece uma continuidade emocional em formas tão cristalinas que sentimos, graças ao seu talento, a novidade dos estados permanentes de alegria, tristeza e cisma, vividos pela nossa gente, à margem de estilos e modas. Um Nazaré e um Tom dispensam colocação didática na história da música brasileira. E em Tom esse sentir brasileiro é também um sentir dos ventos, das ramagens, dos seixos, das vozes de passarinhos, que não são cariocas nem fluminenses, é a "geologia moral" do Brasil, que procuramos esquecer mas subsiste como explicação maior da gente.Tom Jobim, deputado eleito pelos sabiás, canários e curiós para falar, não aos povos da Zona Sul, mas a toda criatura capaz de ouvir e de entender pássaros, trazendo-nos uma interpretação melódica da vida. Isso que ele faz tão bem, cativando a todos. Ou a quase todos, pois seria vão esperar que os amantes do barulho erguido à categoria de música estimassem o antibarulho, o refinamento do som organizado em fonte de prazer estético e explicação do homem por si mesmo. O som de Tom, o som que uma fada (iara, sereia, camena?) lhe deu há 50 anos, presente das matas da Tijuca ao futuro morador do Leblon, ao mais despreocupado dos mestres, e por isso também o mestre que é mais agradável reverenciar.
Salve, Tom, em claro e meigo Tom!

Quando uma árvore é cortada ela renasce em outro lugar. Quando eu morrer quero ir para esse lugar, onde as árvores vivem em paz.
Tom Jobim

quarta-feira, dezembro 08, 2004

Soares é fixe vezes oitenta

A minha mais antiga memória política remonta às eleições presidenciais de 1986. Não cresci numa família altamente politizada, mas nunca me esquecerei da noite eleitoral do confronto que opunha Mário Soares a Freitas do Amaral. Viveram-se momentos de tensão na sala de jantar da casa dos meus avós, até que chegaram os resultados finais. Soares tinha ganho, por uma margem mínima, mas tinha ganho. Foi a primeira, e provavelmente a última, vez que saí para festejar um desfecho eleitoral. Apertado no banco de trás por mulheres eufóricas, já esquecidas da pouca sorte de Maria de Lurdes Pintassilgo na primeira volta, é díficil para uma criança de 6 anos esquecer a sensação de gozo de andar a desfilar pelas ruas de Lisboa com uma bandeira da candidatura de Mário Soares.

Hoje (tudo bem, já passam algumas horas), o homem celebra 80 anos de vida. Ao ler as entrevistas do Diário de Notícias e d' A Capital é difícil separar a figura da história recente de Portugal. Mário Soares confunde-se com a história do país dos últimos anos, sendo um dos seus principais protagonistas e dos mais importantes arquitectos da democracia que hoje temos. Mais do que um «animal político», cliché que o vem (e bem) caracterizando ao longo dos tempo, é um «animal humano». Com um faro tremendo para a política é verdade, mas também com uma projecção e uma construção que ultrapassa a redutora barreira da esfera do político. Mário Soares não é uma figura consensual. Suscita paixões que se equiparam ao nível clubístico, e que atravessam todos os quadrantes do espectro político. É dos poucos políticos, logo um dos mais marcantes da nossa história, que mais ódios e reacções emocionais desperta. Lutou contra a ditadura em todas as frentes, como advogado, como civil, no exílio, nos contactos no estrangeiro.

Impediu os comunistas de chegarem ao poder efectivo, o que a extrema-esquerda nunca lhe perdoou, mas continua a ser o grande inimigo de alguns betinhos, que cresceram a ouvir dizer em casa que o Mário Soares lhes tinha roubado as terras da família. Fez a descolonização possível, e ainda hoje assume sozinho o papel de bode expiatório das neuroses de milhares de pessoas que, ainda assim, tiveram uma integração razoável na sociedade portuguesa. Abriu espaço para a constituição do CDS. Meteu o «socialismo na gaveta», expressão que ainda hoje se atravessa na garganta de milhares de esquerdistas. Jogou o jogo da política. Quando necessário nos bastidores, quando necessário na vida pública. Sempre assumiu essa condição, mesmo que o levasse a perder amizades ou granjear ódios de estimação.
Assumiu-se como primeiro-ministro, num momento em que poucos o quiseram fazer, e mesmo revelando pouco perfil para o cargo conseguiu (contra bastantes vozes): negociar a entrada na CEE e o acordo com o FMI que salvou Portugal da bancarrota. Foi Presidente da República num dos períodos mais estáveis da história da República Portuguesa, e seguiu os seus mandatos com notável intuição política. Já afastado da política nacional, decidiu regressar e candidatar-se a umas eleições europeias. Fez campanha, esteve na rua, debateu, sempre com grande disponibilidade e espírito de combate. Quis ser presidente do Parlamento Europeu e perdeu. Muitos escarneceram, muitos riram, muitos vaticinaram o seu regresso, que nunca se submeteria à condição de simples deputado. Mas Soares fê-lo, cumpriu o seu mandato e viajou com notável frequência entre Estrasburgo e Lisboa, para um homem da sua idade. Continua a bater-se pelas suas causas, e a fazer aquilo que gosta. Política. Seja ao marcar um almoço com Cavaco Silva, ou a empurrar Freitas do Amaral para a presidência da República, Soares é fiel a si mesmo. Aos combates em que acreditam. Gostam de lhe apontar as contradições, mas a única resposta possível é a de que o homem evolui. Gostemos ou não gostemos, temos de respeitar os caminhos que as pessoas escolhem seguir, e que, por vezes, são os combates que nos determinam, e não o contrário. Mário Soares sempre foi um homem que combateu por uma coisa: a liberdade. O cronista mais acidamente cínico da imprensa portuguesa, Vasco Pulido Valente, também historiador, disse-o há alguns tempos: a revolução só surgiu depois do 25 de Abril, e foi feita por Mário Soares, ao impedir que os comunistas tomassem conta do aparelho do estado.

Mário Soares não é uma figura fácil para um país pequenino como Portugal. A atitude de Soares é aquela que mais ódios desperta numa sociedade que viveu asfixiada na mesquinhez durante anos a fio. É grande, gosta da vida, gosta de se divertir. Para ele viver é um prazer, não um sacríficio. Não entra em delírios pios. Para ele fazer política é uma maneira de estar na vida, por si, pelos outros, por aquilo que acredita para o país. É a antítese de Salazar. A figura-pai que ainda paira sob os espíritos de muitos portugueses, e que de algum modo acabou por ser projectada em Cavaco. Não é nenhum santo, e terá cometido bastantes erros ao longo da sua longa carreira. A infelicidade de algumas intervenções também ninguém lhe tira. Mas é assim que se constroem as grandes figuras. Hoje, a unanimidade que parabenizou o Dr. Mário Soares não foi burra. Até as poucas discordantes que se fizeram ouvir lhe devem essa possibilidade.

segunda-feira, dezembro 06, 2004

Ao cuidado de alguém

A andar por aqui, descobri isto. É sempre bom saber que há esperança para o mundo. Mas o que me chamou mesmo a atenção foi o título do post, assim como o último parágrafo do mesmo. Especificando: dois jabs, ainda por cima golpes baixos, a Bonos, Springsteens e companhias. Não sou advogado dos senhores, nem eles precisam, mas acho que muitas vezes nas discussões sobre globalização há bastantes equívocos. E isso também se estende numa espécie de facilitismo no insulto dirigido contra figuras mediáticas que lutam a favor de causas.

Sobre o texto em questão, não sou particular especialista em assuntos económicos, nem nunca li qualquer relatório do Banco Mundial. Lembro-me apenas que há uns anos a Argentina era a menina querida do FMI, e que quando caiu o comunismo na Rússia a comunidade financeira internacional contribuiu de forma vincada no aparecimento dos oligarcas. Não sei se será prematuro tirar conclusões largamente optimistas de um relatório sobre um ano que nem sequer terminou. Mas se há razões para sermos optimistas, óptimo. Não quer dizer é dizer que não se pode ser ainda mais optimista, ou pessimista (depende da perspectiva), e acreditar que as coisas podem ser feitas doutra maneira, ou levando em consideração outros aspectos.

A mim a globalização parece-me um fenómeno excelente. Sou um grande fã, e, inevitavelmente, uma espécie de produto, da globalização. Parece-me é que há muito boa gente que divide a discussão sobre o assunto em dois campos: de um lado os advogados do capitalismo, do comércio livre, e da circulação de capitais sem barreiras; do outro as pessoas que gostam de ir partir montras de McDonald's. A questão do comércio livre parece-me aqui particularmente importante. O fenómeno da globalização económica pode ser concebido e formulado de várias formas. Tenho alguns problemas com a demagogia que se associa a expressões como «livre circulação de capitais», que dizer dos casos em que a especulação aliada a capitais flutuantes já levou países e zonas do mundo à bancarrota, ao mesmo tempo que se proclamam os benefícios do levantamento das restrições comerciais, que, nas limitadas condições impostas pelos países que mandam no mundo, continuam a ser prejudiciais para os países menos desenvolvidos? O que o senhor que escreve o artigo, e a pessoa que o dedica ao Bono, Springsteen, Dr. Soares, e Ana Drago, parecem não perceber, é que pode ser-se a favor da globalização e acreditar que ela pode ser feita de outro modo.

É isso que Mário Soares vem defendendo, sobretudo nos artigos do Expresso, ao longo de vários meses. É isso que os Coldplay dizem, quando apoiam a organização Make Trade Fair. O Bono já é um caso mais extremo. E muito menos popular. O cantor dos U2 meteu-se na realpolitik. Passou a vestir fatos e a ir a cimeiras económicas mundiais. Esteve em Génova, é verdade, mas também esteve em Davos. Esteve com o antigo secretário do tesouro norte-americano, Paul O' Neill, numa «digressão» pela África infectada com SIDA. Foi discutir ciências económicas com os melhores professores de Harvard, tanto os conservadores como os mais liberais, porque queria ouvir as duas versões da história. Reune-se com senadores republicanos e democratas, fazendo lobby para uma causa que acredita transcender the os meandros da política mais resteira. Ninguém estranhou que Bono não tivesse apoiado ninguém nestas eleições americanas? Já o tinha feito com Clinton. Mas os tempos do Rock The Vote acabaram. Agora há um projecto para concretizar. E para isso o vocalista da maior banda rock do mundo aperta a mão a seja quem for. Bono foi ao O'Reilly Factor e conseguiu pôr um dos mais agressivos entrevistadores americanos a concordar com as suas opiniões. Também conseguiu pôr um dos senadores mais conservadores dos EUA a chorar, quando foi por caminhos da religião e do papel do Homem na Terra. Goste-se ou não, concorde-se ou não, reconheça-se o que é devido. É fácil subir a um palco e gritar a 90 mil pessoas que o mundo é uma merda por causa dos políticos. Também é fácil apontar para uma estrela pop e criticar a presunção de pessoas que julgam que podem mudar o mundo, e que nem o sequer o compreendem. É fácil sermos redutores, colar rótulos, afundar-nos no cinismo. Mas, e para acabar em bom tom, que estamos em época natalícia, e tal, uma citação do B-man: «I don't believe I can change the world, but I believe that we all can».

Bono, U2's lead singer, and an unkown man.

quarta-feira, dezembro 01, 2004

An' the cats they gigged in there

In the middle of that hub
I remember one jazz club
Where we went to pat feet
Down on fifty-secon’ street

Everybody heard that word
That they named it after bird
Where the rhythm swooped and swirled
The jazz corner of the world

An’ the cats they gigged in there
Were beyond compare

Birdland - I’m singin’ birdland
Birdland - ol’ swingin’ birdland



Everybody dug that beat
Everybody stomped their feet
Everybody digs be-bop
An’ they’ll never stop



Bird would cook, max would look - yeah,
Down in birdland
Miles came through, ’trane came too - yeah!
Down in birdland
Basie blew, blakey too - yeah!
Down in birdland
All y’ gotta do is lend an ear
An’ listen to it
Then y’ dig a little sooner than soon
You’ll be diggin’ everything diggin’ all the music

What a ball!
(Birdland, Joe Zawinul & Jon Hendricks)

The missing link?

Quando era puto lembro-me de fantasiar com comida. Lembro-me de imaginar que podia comer tudo o que quisesse, quando quisesse, das maneiras que quisesse, sem haver qualquer tipo de consequência ou culpa. Claro que também há as fantasias lúdicas, ou as brincadeiras de armário com as amigas ou primas mais atrevidotas, mas pode ser que me apeteça falar nisso noutra altura. Agora não.

Depois veio a adolescência e a comida deu lugar ao sexo.
(Aliás, de certo modo, a entrega despreendida aos prazeres da gula parece que se transforma numa espécie de empecilho à realização sexual plena. O que é uma ideia completamente rídicula, assim como a adolescência é uma idade ridícula).
Na realidade a diferença nem é muito grande, já que se continua a fantasiar que se pode comer tudo que se quiser, quando se quiser, das maneiras que se quiser, sem haver qualquer tipo de consequência ou culpa.

A explicação estará nas hormonas, na genética, no buço, etc, mas não é isso que me interessa. Interessa-me aquele primeiro momento no estágio evolutivo. A passagem de um estado ao outro. Quando, finalmente, o nosso subconsciente é tomado de assalto por um frenesim de luxúria. Se esta não foi a principal protagonista do primeiro sonho «daqueles», é certamente a mais antiga de que me lembro. Cá está, o elo perdido:

Post/comentário ao xixi do António Maria

O António Maria escreveu um belo post sobre o xixi. Não exactamente, e felizmente, sobre o xixi dele, mas sobre uma situação problemática que aflige alguns homens. O post suscitou-me um comentário. Mas, quando já estava a meio da escrita do mesmo, pensei: «eh pá, e será que alguma casa de alta costura alguma vez se lembrou de combinar tiras de veludo com spandex, em belos tons de ocre e castanho navalha?». Desculpem. Não era bem este o pensamento. Foi mais assim: «eh pá, e se em vez de deixar aqui um comentário eu escrever um post sobre isso no meu blog? Seria um bom pretexto para escrever alguma coisa, já que não o faço regularmente há algum tempo, e parece-me algo muito blogoferiano, esta interblogaridade e tal.» Eu sei que o António se está a cagar para o blogosfera e teria preferido que eu deixasse um comentário no blog dele, mas isso não vai acontecer. É que com esta introdução de merda já consegui preencher umas boas linhas, mandar umas piadas e usar dois pares de aspas. O que é salutar.

Sobre a questão em questão: Aposto que quase toda a gente, a algum ponto da vida, teve de ser obrigado a urinar sem ter grande vontade. Também aposto que quase toda a gente já se viu numa situação em que não lhe dá muito jeito ter de urinar mais tarde, por isso é melhor fazer agora. - escreve o António Maria.

O oqé1blogger refere-se sobretudo à situação em que um homem está prestes a safar-se com uma gaja (sim uma gaja, porque safar-se com alguém, neste país recalcado, só mesmo com uma gaja) numa noite de discoteca. Daí a questão de «não vamos querer ter de chegar a casa e pedir-lhe para esperar, que vamos ali à casa-de-banho e não demora nada.» Mas, parece-me que o A.M. se esquece de uma questão muito importante. Nessas situações, quando se chega a casa, ao motel, ao palheiro, à gruta do menino jesus, o que preferirem, é geralmente a mulher que tem de ir à casa de banho, trancando-se na mesma por uns bons 15 minutos. O que me parece muito bem. O que elas fazem lá dentro não se quer saber nem imaginar. E isto continua a parecer-me muito bem.

Ora é nesse espaço de tempo que o homem pode aproveitar para fazer o que bem entender. Se quiser aliviar a bexiga vai procurar outra casa-de-banho. Se não houver outra casa-de-banho há sempre o lava-loiça ou a janela mais próxima. Em última análise aquele receptáculo dos guardas-chuva também funciona muito bem. E isto demora, no máximo, cinco minutos. O restante tempo pode ser aproveitado em rituais preparatórios fetichisantes, para quem os tiver, ou simplesmente para gamar umas pratas aos velhos da miúda. Com esta estratégia ainda se ganha outra coisa: escusamos de deixar a gaja sozinha na discoteca enquanto temos de ir mijar, o que a deixa ao alcance de qualquer marialva armado em abutre, e, vamos ser sinceros, se ela está disposta a vir connosco, vai com qualquer um (falamos aqui de uma gaja, não esquecer).

Por outro lado convém dizer que a eficácia da estratégia do esvaziamento da bexiga antes do acto sexual não é consensual a nível da doutrina. Mas isso já tem a ver com abordagens pessoais. Quem quiser saber mais sobre o assunto leia isto.
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